28.12.04

"Quero morrer sua amiga!"

Noite chuvosa de domingo. Ocasião perfeita pra um bom vídeo, capuccino, namorado, cobertas... pois é, então como eu ia dizendo, eu e o bofe, apesar do cenário acima descrito, resolvemos ir ao cinema.
Ai se arrependimento matasse!

Fomos ao Cine Academia que costuma trazer filmes fora do circuito comercial. Também é conhecido como cult (sim, fresco é um ótemo sinônimo), possui um público alternativo (very strange!) e intelectualizado (arrogantemente chato).
Eu adorava ir à Academia de Tênis porque o cinema era uma delícia: três salas pequenas, barulho zero e aquelas poltronas enormes de couro, super confortáveis.
Mas tudo que é bom, senhoras e senhores, acaba.
Depois da reforma, o cine Academia está mais para a calçada da fama do que para uma sala de projeção.
Bem, ou isso ou o shopping em época de férias escolares!

Decidimos pela película do Bertolucci, Os Sonhadores.

Parêntesis: diz a recomendação do jornal:
Durante os históricos protestos estudantis em maio de 68 em Paris, um jovem americano inicia uma bela amizade com um casal de irmãos.

Foram as duas horas mais angustiantes dentro de uma sala de cinema.

Eu pensava cá comigo: “não, vai melhorar. É só o começo do filme”.

Vinte minutos depois: “Será que esse é o filme do Bertolucci? Ou eu comprei o ingresso errado? Ou o ingresso está certo, eu que entrei na sala errada?”

Uma hora depois: “quando será que esse filme acaba, mon Dieu?”

...protestos estudantis em maio de 68 em Paris...
Onde? O que levou aos protestos?
Ah, pelo menos era Paris!

...uma bela amizade...
Que amizade? Um americano cinéfilo deslumbrado e um casal francês cinéfilo, bizarro e alienado.

A história político-cultural de 68 se perde diante da confusão de sentimentos dessas três personagens.
Ok, não vai ter História? Então vamos para os dramas individuais, as questões eminentemente humanas.

Dramas? Questões? Jovens franceses se esbaldando com vinhos caros (comprados com dinheiro de papa e mama), consciência zero, egocêntricos, possuidores de uma liberdade sem limite, arrotam opiniões porque lêem alguma poesia e assistem filmes na Cinemathéque Française!

Pelo amor dos meus filhinhos!
Não me importo que um filme discuta sobre tafetás e vinhos caros. É um direito do cineasta fazer o que bem entender com sua arte, mas diga ao que veio.
Os parnasianos escreviam com perfeição de métrica e rima seus sonetos alexandrinos sobre um vaso grego, um espelho de ouro. Tudo bem. Não me diz nada um vaso grego, mas essa era a proposta do movimento: a exaltação do belo, da forma. Eles avisaram! Que ninguém se faça de ofendido se se propuser a ler os parnasianos.

Saí da sala de cinema tentando salvar o filme, procurando um sentido, a proposta, uma estética, sei lá, qualquer coisa...

Então algo fez sentido pra mim. Não importa o país, França, Brasil, Rússia, Alemanha... sempre existirão aqueles que se camuflam, usam um movimento, uma idéia para justificar sua total falta de comprometimento com a vida.
Aqui tivemos a nossa famosa “esquerda festiva” e lá, que nome teve?

Nenhum comentário:

Arquivo do blog